Presidência da República
Casa Civil
Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos

PROJETO DE LEI Nº 5.893, DE 2025

Mensagem nº 1.711, de 2025

Exposição de Motivos

Institui o Plano Nacional de Cultura para o decênio 2025-2035.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1º  Fica instituído o Plano Nacional de Cultura para o decênio 2025-2035, observado o disposto no art. 215, § 3º, e no art. 216-A da Constituição, com vistas ao desenvolvimento cultural do País e à integração das ações do Poder Público.

Art. 2º  São princípios do Plano Nacional de Cultura:

I - o respeito e a valorização da diversidade e das identidades culturais em todas as suas manifestações;

II - o reconhecimento do valor econômico, simbólico e social da cultura;

III - o reconhecimento da cultura como elemento essencial para um modelo de desenvolvimento democrático, inclusivo, justo e sustentável;

IV - a reparação cultural e o fomento justo e equilibrado;

V - a valorização dos trabalhadores da cultura, dos seus ofícios e das suas ocupações, com efetivação do direito à seguridade social e com condições dignas de trabalho;

VI - o reconhecimento dos mestres e das mestras das culturas tradicionais e populares como trabalhadores da cultura;

VII - a valorização e a defesa dos direitos humanos e da democracia; e

VIII - a garantia do exercício dos direitos culturais, considerados:

a) o direito universal a acessar à cultura e produzi-la;

b) o direito à arte, à criatividade e à imaginação, em todas as suas formas e suas manifestações, de modo a incentivar a experimentação e a inovação;

c) o direito à liberdade de expressão, à criação e à fruição cultural sem censura ou repressão;

d) o direito à memória, ao patrimônio cultural, à salvaguarda e à preservação de práticas, saberes tradicionais e acervos documentais, museológicos, bibliográficos e digitais;

e) o direito à informação, à comunicação e à livre expressão de pensamento sobre manifestações culturais;

f) o direito à participação social, à transparência e ao controle social nas políticas culturais;

g) o direito à acessibilidade cultural, garantido o acesso pleno de pessoas com deficiência e mobilidade reduzida à cultura, tanto como público quanto como fazedores de cultura; e

h) o direito autoral e o direito à proteção e ao reconhecimento da criação intelectual, assegurada a remuneração justa aos criadores.

CAPÍTULO II

DAS DIRETRIZES

Art. 3º  São diretrizes do Plano Nacional de Cultura:

I - potencializar o papel da política cultural no fortalecimento da democracia;

II - estimular a criação, a pesquisa, a preservação, a memória, a produção, a distribuição, a circulação, a formação e a fruição cultural;

III - valorizar as diversidades culturais, sociais e territoriais;

IV - assegurar o reconhecimento da interseccionalidade na promoção dos direitos culturais;

V - priorizar, nas políticas culturais, grupos vulnerabilizados para reduzir as desigualdades estruturais na sociedade brasileira;

VI - promover e oportunizar a difusão das diversas expressões culturais;

VII - favorecer o pensamento crítico e a pluralidade das produções e dos conteúdos culturais artísticos no ambiente digital;

VIII - garantir a distribuição justa e equitativa dos recursos da cultura, de forma a reduzir as desigualdades territoriais no acesso às políticas culturais;

IX - desburocratizar e simplificar os procedimentos de acesso às políticas culturais e adequá-los às realidades dos agentes culturais;

X - ampliar o acesso da população às políticas e às ações culturais;

XI - promover a territorialização das políticas culturais, com atenção especial a territórios vulnerabilizados;

XII - valorizar, reconhecer e fomentar os conhecimentos, as tecnologias e as práticas dos povos e das comunidades tradicionais;

XIII - considerar, na implementação de políticas culturais, as particularidades territoriais, ambientais e de conectividade da região amazônica;

XIV - fortalecer a pactuação federativa e aprofundar a cooperação e a implementação de ações coordenadas entre os entes federativos;

XV - promover a cooperação e a complementaridade, nacional e internacional, entre agentes públicos, privados e sociedade civil;

XVI - garantir, por meio do Sistema Nacional de Cultura, a governança participativa nos processos e nas instâncias das políticas culturais;

XVII - promover a intersetorialidade e a integração das políticas culturais com as demais políticas públicas;

XVIII - promover o controle social e assegurar o livre acesso, a transparência, o compartilhamento, a segurança e a confiabilidade das informações relativas às políticas culturais;

XIX - promover a cultura de base comunitária e o desenvolvimento de territórios criativos e sustentáveis;

XX - garantir os direitos culturais de crianças, adolescentes e jovens, de forma a reconhecê-los como sujeitos culturais, a valorizar as suas expressões e a promover a sua participação ativa na cultura; e

XXI - promover a ampliação e a execução efetiva dos recursos públicos destinados à cultura.

CAPÍTULO III

DAS TRANSVERSALIDADES

Art. 4º  Deverão ser observadas as seguintes transversalidades como elementos estruturantes do Plano Nacional de Cultura:

I - interseccionalidade - reconhecer que as desigualdades se combinam, interagem e se sobrepõem na vida das pessoas, de modo a desenvolver aspecto integral na formulação de políticas culturais que promovam a reparação cultural e o protagonismo de diferentes indivíduos, coletividades, comunidades, populações e povos;

II - territorialidade - garantir uma abordagem de territorialização das políticas culturais de forma a ampliar e desconcentrar investimentos no território brasileiro, consideradas as especificidades e as diversidades culturais, socioambientais e regionais, com prioridade para territórios vulnerabilizados;

III - acessibilidade cultural - possibilitar a todas as pessoas, principalmente àquelas com deficiência ou mobilidade reduzida, o exercício dos direitos culturais e o acesso pleno a programas, projetos e ações culturais, tanto como público quanto como fazedores de cultura, consideradas as suas diversidades físicas, sensoriais, intelectuais, linguísticas, interativo-sociais e culturais e demais processos demandados pelas diferenças e pelas diversidades humanas;

IV - culturas indígenas e afro-brasileiras - reconhecer a diversidade, a pluralidade e a importância das culturas indígenas e afro-brasileiras para a formação da sociedade brasileira e a valorização de seu papel central na afirmação da democracia, das políticas reparatórias, das ações afirmativas e das estratégias de proteção, salvaguarda e promoção que estimulem o protagonismo das populações negras e indígenas;

V - intergeracionalidade - promover a valorização dos vínculos intergeracionais nas políticas culturais, assegurada a participação de crianças, adolescentes, jovens, adultos e pessoas idosas na criação, na fruição, na transmissão e na salvaguarda dos bens, dos saberes e das práticas culturais; e

VI - intersetorialidade - ampliar e fortalecer a integração das políticas culturais com as demais políticas públicas, com vistas a promover resultados integrados.

CAPÍTULO IV

DOS EIXOS E DOS OBJETIVOS ESTRATÉGICOS

Art. 5º  São eixos estratégicos do Plano Nacional de Cultura e seus respectivos objetivos:

I - Eixo 1 - Gestão e Participação Social - consolidar o Sistema Nacional de Cultura e a sua efetivação nos territórios, com financiamento contínuo e descentralizado, formação continuada para gestores, servidores e conselheiros, informações e indicadores estruturados, transparência e participação social ampla e diversa;

II - Eixo 2 - Fomento à Cultura - reduzir as desigualdades e equilibrar o investimento público no acesso ao fomento às artes e à cultura, observadas a distribuição equitativa dos recursos em todo o território nacional e a desconcentração territorial, com atenção ao fator amazônico, às ações afirmativas e reparatórias, à simplificação de acesso e à garantia de acessibilidade cultural;

III - Eixo 3 - Patrimônio e Memória:

a) democratizar a política de patrimônio e memória, com políticas afirmativas, formativas e reparatórias, assegurada a salvaguarda de expressões, ofícios, saberes, acervos e bens culturais, artísticos e naturais, com a desburocratização de processos, e a ampliação da participação social, da cidadania cultural e do acesso à produção, à reprodução e à fruição nos territórios;

IV - Eixo 4 - Formação:

a) universalizar a presença das artes, da cultura e da memória nos currículos, nos conteúdos e nas iniciativas pedagógicas dos ensinos infantil, fundamental, médio, técnico e superior, de modo diversificado, acessível e criativo; e

b) reconhecer e valorizar mestres e mestras, agentes, organizações culturais e comunidades como produtores, guardiões e transmissores de conhecimento e aprendizagem;

V - Eixo 5 - Infraestrutura, Equipamentos e Espaços Culturais:

a) ampliar e desconcentrar equipamentos e espaços culturais acessíveis, sustentáveis e adequados aos contextos locais, com prioridade a territórios periféricos ou vulnerabilizados; e

b) aprimorar a gestão, assegurar a manutenção e ampliar o uso dos equipamentos e a ocupação dos espaços culturais pela população, com programação cultural diversificada, democrática e acessível;

VI - Eixo 6 - Economia Criativa, Economia Solidária, Trabalho, Emprego, Renda e Proteção Social:

a) potencializar a participação do campo cultural da economia criativa brasileira na economia nacional e internacional, de modo a fortalecer indústrias, empreendimentos, arranjos criativos, e modelos solidários; e

b) promover a geração de emprego e renda e a formalização de empreendimentos, organizações e trabalhadores da cultura, com efetivação dos direitos trabalhistas, sociais e previdenciários e com reconhecimento de atividades e ocupações artísticas e culturais;

VII - Eixo 7 - Cultura, Bem Viver e Ação Climática:

a) proteger, valorizar e fomentar culturas e conhecimentos dos povos e das comunidades tradicionais, dos povos indígenas e das comunidades de matriz africana como estratégia de resiliência e promoção do bem viver e ação climática; e

b) promover a adaptação, a mitigação e a recuperação do setor cultural diante dos impactos de desastres e emergências ambientais e sanitárias, em articulação com agentes, grupos, comunidades e espaços culturais; e

VIII - Eixo 8 - Cultura Digital e Direitos Digitais:

a) promover uma cultura digital democrática e incentivar as diversas linguagens artísticas e expressões digitais, a inovação, o pensamento crítico, o letramento digital, as tecnologias livres e acessíveis e as redes colaborativas; e

b) assegurar e proteger os direitos de autores, artistas e titulares de direitos autorais e conexos no contexto do ambiente digital e da inteligência artificial, com políticas reparatórias de acesso a grupos historicamente vulnerabilizados.

CAPÍTULO V

DAS METAS, DAS AÇÕES ESTRATÉGICAS E DOS INDICADORES

Art. 6º  As metas do Plano Nacional de Cultura serão elaboradas pelo Ministério da Cultura, com ampla participação do Conselho Nacional de Política Cultural, dos entes federativos e da sociedade civil e serão publicadas por meio de ato do Poder Executivo federal em até noventa dias da publicação desta Lei.

§ 1º  As ações estratégicas do Plano Nacional de Cultura, instrumentos destinados à consecução de cada meta, materializam a execução operacional do Plano e serão delineadas, desenvolvidas e articuladas no âmbito do Sistema Nacional de Cultura, com vistas ao alcance dos objetivos e das metas.

§ 2º  As ações estratégicas, de que trata o § 1º, deverão considerar as vocações, as competências e as atribuições federativas, com a participação ativa dos representantes dos conselhos e das instâncias de decisão do Sistema Nacional de Cultura e deverão conter, no mínimo:

I - a indicação do órgão responsável;

II - o prazo de implementação;

III - a relação com as metas do Plano Nacional de Cultura; e

IV - a relação com os objetivos do Plano Nacional de Cultura.

Art. 7º  Os indicadores serão elaborados pelo Ministério da Cultura e instituídos por meio de ato do Poder Executivo federal.

Art. 8º  Os Planos Setoriais Nacionais serão publicados em ato do Poder Executivo federal, com modelo de monitoramento semelhante ao do Plano Nacional de Cultura, considerados seus princípios, suas diretrizes, suas transversalidades, seus eixos, suas ações estratégicas e seus objetivos, com vistas às especificidades do setor cultural a que se refere.

CAPÍTULO VI

DA GOVERNANÇA

Art. 9º  Fica instituído o Comitê de Governança do Plano Nacional de Cultura, instância responsável pela coordenação estratégica da implementação do Plano, com representação do Ministério da Cultura, do Conselho Nacional de Política Cultural e dos órgãos gestores de cultura dos entes federativos indicados pela Comissão Intergestores Tripartite do Sistema Nacional de Cultura.

Parágrafo único.  A composição, a organização e o funcionamento do Comitê serão estabelecidos em ato do Poder Executivo federal.

CAPÍTULO VII

DAS ATRIBUIÇÕES DO PODER PÚBLICO

Art. 10.  Compete ao Ministério da Cultura:

I - coordenar, em âmbito nacional, a implementação, o monitoramento, a avaliação e a revisão periódica do Plano Nacional de Cultura;

II - assegurar a coleta, a sistematização e a divulgação de informações necessárias ao acompanhamento, ao monitoramento e à avaliação do Plano Nacional de Cultura, inclusive para subsidiar o Conselho Nacional de Política Cultural em suas atribuições, observado o disposto no art. 17 da Lei nº 14.835, de 4 de abril de 2024;

III - disponibilizar instrumentos e metodologias de assistência federativa para elaboração, implementação, monitoramento e avaliação de planos de cultura estaduais, distrital e municipais, considerados as especificidades territoriais, os arranjos regionais e as possibilidades de cooperação entre os entes federativos; e

IV - articular-se com os demais órgãos do Poder Executivo federal para garantir a transversalidade das políticas culturais.

Art. 11.  Compete aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - elaborar seus próprios planos de cultura ou rever aqueles já existentes, considerados como referência as diretrizes, os princípios, os objetivos e as metas do Plano Nacional de Cultura, e observadas as especificidades de cada território;

II - orientar as políticas culturais localmente para o alcance dos resultados do Plano Nacional de Cultura, consideradas as diferentes vocações, competências e atribuições federativas referentes aos objetivos e às metas do Plano; e

III - fornecer ao Ministério da Cultura as informações necessárias ao monitoramento, à avaliação e à revisão do Plano Nacional de Cultura.

Art. 12.  A adesão ao Plano Nacional de Cultura será automática e imediata para todos os entes federativos que formalizarem adesão ao Sistema Nacional de Cultura.

Art. 13.  Os planos estaduais, distrital e municipais de cultura deverão estar coerentes com o Plano Nacional de Cultura, a fim de garantir alinhamento aos princípios, às diretrizes, às transversalidades, aos objetivos e às metas em âmbito nacional, sem prejuízo das particularidades regionais e locais.

§ 1º  As unidades federativas que possuírem planos em vigor deverão adequá-los às disposições desta Lei e promover as revisões e as atualizações necessárias, com a participação dos representantes de conselhos e dos setores culturais locais.

§ 2º  A elaboração, a implementação e o monitoramento dos planos estaduais, distrital e municipais de cultura deverão ser pactuados localmente nas instâncias do Sistema Nacional de Cultura, considerados a participação social, os conselhos de cultura e as comissões intergestores.

CAPÍTULO VIII

DO MONITORAMENTO E DA AVALIAÇÃO

Art. 14.  O processo de implementação das ações estratégicas e das iniciativas contará com rotinas regulares de monitoramento e avaliação e incorporará mecanismos de participação dos conselhos e dos setores culturais, observada a possibilidade de ajustes contínuos, de modo a garantir a sua perenidade.

Art. 15.  O monitoramento e a avaliação do Plano Nacional de Cultura, de que trata o art. 10, caput, inciso I, contará com a participação do Conselho Nacional de Política Cultural e das comissões gestoras do Sistema Nacional de Cultura e poderá ter o apoio de especialistas, técnicos e agentes culturais, de institutos de pesquisa, de universidades, de instituições culturais e de organizações e redes socioculturais.

Art. 16.  Será dada ampla divulgação aos objetos avaliados e aos resultados alcançados pelo monitoramento e pela avaliação periódica do Plano Nacional de Cultura, com informações acessíveis e em formatos diversos.

Art. 17.  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Belém,